
Agora que a guerra terminou talvez a lucidez retorne aos brasileiros. Não, não imagino que a lucidez retorne às redes sociais. A loucura campeia no “face” e no twitter. Belas ferramentas, uma verdadeira revolução, mas para a maioria que as utilizaram durante as eleições não passam de trituradores de candidatos e, por extensão, da ética, moral e inteligência.
Incrível como pessoas comuns se transformam ali, principalmente no “face”. Não há espaço para debater ideias, programas, o que importa é acabar, destruir o adversário, naquele momento o maior inimigo.
O que seria uma grande festa cívica – a primeira vez em que 3 mulheres disputaram a Presidência da República – virou uma guerra suja, em que a verdade era o detalhe menos considerado.
Sequer se dão ao trabalho de olhar para a nossa artificial democracia. Baseado no poder financeiro de candidatos (não precisam ser milionários, mas é fundamental que tenham “costas quentes”, geralmente de empreiteiros, banqueiros, latifundiários do agronegócio, etc.) o sistema eleitoral está longe de ser exemplo democrático.
A começar pela imposição: as pessoas são obrigadas a votar!
Mesmo assim, e sabendo do quão ridículas são as multas por não votar (o valor da penalidade varia de R$ 1,05 a R$ 35,14), milhões de eleitores nem se abalam.
Vamos aos números nacionais:
O Brasil tem um colégio eleitoral de 142.821.358.
Dos quase 143 milhões de eleitores, a vencedora colheu 54.501.118.
O candidato derrotado conseguiu 51.041.155 votos.
Ou seja, os dois candidatos que chegaram ao segundo turno conseguiram 105 milhões 542 mil 273 votos. É este número que o Tribunal Superior Eleitoral chama de votos válidos.
O TSE e as leis brasileiras simplesmente apagam os 1.921.819 (1,71%) de votos brancos e os 5.219.787 (4,63%) votos nulos. Pela lei não valem nada.
A alta abstenção também não chamou a atenção das redes. Mais de 30 milhões de pessoas (30.137.479 ou 21,10% dos eleitores) não foram votar.
Teria sido este o protesto de milhões de pessoas contra o sistema?
Vamos aos números na eleição estadual na Bahia:
Rui Costa obteve 54,53% dos votos considerados válidos (3.558.975 votos) pela Lei Eleitoral. Paulo Souto ficou com 37,39% (2.440.409 votos). Lídice da Mata, 6,62% (432.379 votos); Marcos Mendes 0,78% (50.891 votos); Da Luz, do PRTB, 0,43% (27.781 votos); e Renata Mallet, do PSTU, 0,26% (16.788 votos).
Foram apurados 7.818.832; descartam os brancos 496.697 (6,35%) e os nulos 794.912 (10,17%) e chegam aos válidos: 6.527.223 (83,48%).
Ninguém fala, mas mais de 2 milhões de eleitores não foram digitar número nenhum: 2.360.558 (23,19%).
Se verificar direitinho, verá que o número da abstenção foi apenas 80 mil votos a menos que o resultado do segundo colocado.
“Nós” e “Eles”
O massacre nas redes sociais impedem que lucidez e inteligência andem juntas. Pessoas comuns, outras contratadas unicamente para criar perfis falsos e dirigentes partidários ficam 24 horas dando estocadas em seus “inimigos”.
Como disse a jornalista Ruth Aquino, da revista Época, “Nós” e “eles” estamos irremediavelmente ligados por um amor comum. O destino do país. E o país são as pessoas”.
No entanto, a insanidade durante as eleições e até depois impedem que todos vejam o país dessa forma. Daí surgem manifestações racistas, desabafos, impropérios de todo tipo.
E mesmo que se tentasse “culpar” uma região por resultado favorável a A ou B, não se pode esquecer que Dilma venceu a eleição em Minas e no Rio de Janeiro. A presidente fez 20.126.579 votos no Nordeste e 19.867.894 no Sudeste. Uma diferença de 258.685.
Nunca é demais lembrar que marqueteiros petistas passaram a explorar a ideia de “país dividido” desde a campanha para o segundo governo de Lula. As redes sociais vieram depois e ajudaram a disseminar isto, agora há a grita geral contra os preconceitos de regiões para regiões. O que parecia ser apenas uma “ideia brilhante” de marqueteiros para vencer eleição, agora tomou uma proporção muito maior.
Cabe aos dirigentes partidários, principalmente do PT porque é o partido que vence as eleições presidenciais há doze anos, desautorizar seus marqueteiros e fazer uma autoanálise sobre o mal que causam com esse tipo de propaganda durante a campanha e atualmente até fora dela.
Na campanha à Prefeitura de Salvador, há dois anos, tentou-se o mesmo, os petistas inventaram até um quadro típico (o “pé de pranta”). Com personagens falando errado, com deboche à ética e à moral, citando gírias do tráfico e cultivando uma planta considerada droga ilícita, os marqueteiros petistas felizmente não obtiveram sucesso e o quadro não durou a campanha toda, mas fica o registro para chefes do partido se antenarem.
Voltando a Ruth Aquino, “nós” e “eles” votamos – seja qual for o candidato – com sonhos parecidos. Que o Brasil vença a ignorância e o subdesenvolvimento. Que a inclusão social não signifique nivelamento por baixo. Que o conhecimento seja valorizado e se erradique o analfabetismo. Que o combate à desigualdade se qualifique por oportunidade real de ascensão, e todos tenham direito a saneamento e a moradia digna.
“Nós” e “eles” votamos para que não se adie mais a construção maciça de creches em todo o território nacional. Para que se cumpram as promessas de educação em tempo integral, e as escolas não parem por falta de professores. Para que se fiscalize a qualidade dos cursos técnicos e os mestres ganhem dignamente.
“Nós” e “eles” votamos para dar um basta às maracutaias de poderosos. Para que uma reforma política inclua prestação de contas, transparência e fim da corrupção que enlameou do planalto às planícies e contaminou uma estatal como a Petrobras. Votamos para sanear as contas do governo federal e saber se nossos impostos beneficiarão a população ou continuarão a encher os bolsos dos corruptos.
“Nós” e “eles” votamos para que o Brasil tome vergonha na cara e reduza drasticamente o recorde atual de 56.337 homicídios por ano – desses, 30.072 são jovens entre 15 e 29 anos! Números de guerra que revelam o fracasso da política nacional de segurança. Em 100 países, o Brasil está em sétimo lugar no extermínio de sua própria gente. Nosso país elucida apenas 8% dos homicídios. Votamos para não ser mais assaltados na rua, na praia, dentro de casa, na saída do banco, no ônibus, no carro, por gente que não dá valor à vida e atira na cabeça.
isso, brown!
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Parabéns, Bomfim,
Muito bom. Encaminhei para vários amigos. Uma análise excelente sem tomar partido nas cretinices que se lê por aí.
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Perfeito, Principalmente a parte: A começar pela imposição: as pessoas são obrigadas a votar!
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